quinta-feira, 25 de março de 2010

Salário baixo, trabalho ruim

Existe uma lógica perversa que habita a mente de boa parte do empresariado brasileiro: pagar pouco e exigir muito. Como o mercado de trabalho está saturado em alguns setores, a lógica se mostra bastante eficaz naquelas profissões em que a procura é maior que a demanda: está insatisfeito, tem outro para trabalhar em seu lugar.
O que o empresariado não percebeu ainda é que, quanto mais baixo o salário, pior será o desempenho do funcionário. Essa também é uma lógica fácil de se verificar. O achatamento de salários em todos os setores fez surgir uma categoria de funcionários que, por receberem pouco, se dedicam pouco. Mais agravante que isso é o fato de que, como o salário é baixo, as vagas acabam sendo ocupadas pelos menos qualificados. E os menos qualificados, como sabemos, acabam desenvolvendo um serviço abaixo do que a vaga exige, em muitos casos.
Um bom exemplo disso são os bancos. Sou filha de um gerente aposentado do Banco do Brasil, e meu pai é da época em que o salário compensava as horas de trabalho. Compensava e também exigia dos funcionários um alto grau de conhecimento das operações bancárias. Hoje os salários dos bancários estão achatados, assim como a maioria das áreas. Muitos funcionários estão ali apenas enquanto terminam a faculdade e, quando isso ocorre, deixam as agências para se dedicar a uma carreira mais lucrativa.
Nada condenável nisso, afinal, todo mundo quer progredir na vida. Porém, como o funcionário sabe que ali não vai ficar, não se preocupa sempre em fazer um trabalho excepcional ou ter um conhecimento melhor daquilo que está fazendo.
Esta semana ocorreu um fato com um colega que mostra bem o que estou dizendo. Ele precisava fazer uma transferência bancária do Brasil para os Estados Unidos. Procedimento simples, mas que se tornou complicado porque a gerente da agência não se deu ao trabalho de verificar se era possível fazer a transação e já informou que somente poderia fazer um câmbio (a uma taxa de R$ 52). Interessante é que ela ainda desdenhou da mulher do colega quando esta perguntou se poderia fazer a transferência, já afirmando em tom irritado que isso não existia.
Talvez, se ela fosse mais motivada, tivesse verificado que a transferência existe e pode ser feita a qualquer banco. Por incompetência, má vontade ou preguiça (não sei dizer o que exatamente), ela fez o tal “câmbio”, enviando o dinheiro a uma outra agência que não tinha nada a ver com quem o receberia, e com prazo de apenas dois dias para a retirada. Assim, um dinheiro que poderia ser depositado direto em uma conta teve toda essa movimentação desnecessária.
Será que, se ela recebesse um salário melhor, trabalharia com todo esse desconhecimento do próprio serviço? Ou ela se empenharia em resolver o problema da melhor maneira? Ou será que a agência teria alguém mais qualificado para o cargo se o salário fosse maior?
Não quero justificar a atitude de gerente, até porque eu acredito que, se você está insatisfeito com seu salário, deve procurar coisa melhor mas, enquanto estiver nele, deve dar o melhor de si. Vi uma entrevista de um gestor de Recursos Humanos em que ele dizia exatamente isso, e exemplificava com os jogadores de futebol: todos eles começam em escolas de base, recebendo, quando muito, um salário mínimo. E nem por isso fazem gol contra.
Assim deve ser a mentalidade de todo trabalhador. Também acho que deveria ganhar mais do que ganho, e nem por isso chego ao jornal pensando em fazer um trabalho malfeito. Sempre penso o seguinte: é meu nome que está estampado na página. Será que com isso não vou conseguir algo melhor um dia? Ou prefiro me juntar à massa dos que reclamam, se acomodam e não fazem nada para mudar?
Tanto trabalhadores quanto empresários precisam mudar essa mentalidade escravo-senhor de engenho. Devo receber de acordo com o que faço e, se for o caso de ganhar mais, merecer esse aumento. Em contrapartida, o empresariado deve começar a enxergar que, quanto melhor o salário, melhor o funcionário e, por consequência, melhor o seu produto.

Um comentário:

Ikari disse...

Ótimo comentário. Gostei bastante, principalmente da parte do gol contra. Mas brasileiro é assim mesmo não só no BB mas em todo lugar, ele se contenta em ganhar pouco.(Até aquele com um curriculum de peso)
Os outros bancos são bem piores que o BB, (vugo os particulares) esses sim exploram desmedidamente, e lá só tem graduados. Uma outra ventagem que o BB tem é a possibilidade de crescer e receber muito bem. Acho que isso é o que dá mais motivação ao pessoal de trabalhar. Obrigado por ler! Tenha uma ótima noite!