No último dia 30, o Brasil inteiro ficou chocado com as
imagens de um garoto de 11 anos que ultrapassou a área de segurança da jaula de
um tigre no zoológico de Cascavel, no Paraná, provocou o animal que, num ataque
súbito, dilacerou seu braço, que teve de ser amputado na altura do ombro. Muito
mais que o ataque, o que revoltou as pessoas foi saber que o pai do menino, que
o acompanhava, havia permitido que ele se aproximasse do animal.
Numa polêmica que tomou conta das redes sociais, muitas
pessoas exigiram o isolamento total do tigre e seu sacrifício, enquanto
defensores dos animais acertadamente protestavam contra tal pedido, visto que o
felino estava tranquilamente em seu lugar, e somente se voltou contra o garoto
após ter sido provocado. Em alguns comentários despropositados, cheguei a ler
que isso não teria acontecido se houvesse vigilantes perto das jaulas que
coibissem a entrada das pessoas na área não permitida.
Qualquer pessoa que tenha ido a um zoológico sabe que
existem placas mais do que em número suficiente e visíveis mostrando aos
frequentadores quais os locais permitidos a sua entrada. Assim, o pai do menino
sabia que ele não poderia estar naquele lugar, e nada fez para impedi-lo de
chegar perto do felino. Um caso claro de desobediência às regras do zoológico,
assim como tantas outras que vemos sendo ignoradas em nosso cotidiano.
Essa é a diferença clássica entre obediência – que denota
respeito a uma determinada regra – ou medo de ser pego fazendo algo errado. O
menino – que agora terá de se adaptar a uma vida com prótese no lugar de seu
braço – sabia que estava fazendo algo errado. Talvez não tivesse noção do real
perigo que corria – quantos de nós não nos arriscamos quando crianças? – mas
tinha consciência de que não podia estar no lugar onde se encontrava. Assim
como seu pai sabia que ele estava infringindo a regra do lugar. Porém, como
ambos tinham consciência de que não estavam sendo vigiados, incorreram no erro
tendo a certeza absoluta da impunidade, sem contar com o ataque do tigre.
E assim agimos em nosso dia-a-dia. Cometemos pequenos
delitos confiantes em que nada vai acontecer quando não temos ninguém nos
vigiando. Só agimos de acordo com o que está determinado quando temos certeza
absoluta de nossa punição. Na verdade, não temos respeito e nem acreditamos que
devemos ser obedientes às regras, mas adotamos os comportamentos
pré-estabelecidos por medo da consequência que pode nos atingir. E assim vamos
agindo em nosso cotidiano, sempre na certeza de nossa impunidade. Uma pena que,
para aprendermos a agir por obediência, muitas vezes nossa punição tenha de ser
uma perda tão grande quanto um braço amputado.
Entramos em uma loja e, a despeito dos avisos para não
tocarmos nos objetos de vidro, o fazemos mesmo assim (quem nunca quis “ver com
a mão”?), e colocamos rapidamente no lugar. Deixamos que nossos filhos corram
em locais onde deveriam ficar quietos, porque “é difícil segurar criança no
mesmo lugar durante muito tempo”. Estacionamos em vagas proibidas “só por cinco
minutinhos”, garantidos pela cumplicidade silenciosa daqueles que, vendo nosso
comportamento, fica quieto porque “não tem nada a ver com isso”.