Hoje faz um ano que, contra todas as possibilidades existentes pelas
leis naturais da vida, meu tio Valdir se foi, levado por um acidente de carro
causado por uma jovem que perdeu o controle de seu veículo em uma manhã
bastante chuvosa. Em cinco segundos duas vidas se acabaram em uma pista única
perto da entrada de Piracicaba. Ironicamente meu tio, que viajava o Brasil
todo, em estradas de péssima conservação, morreu quase em sua casa, pouco
depois de ter avisado sua mulher que estava chegando para o almoço.
Valdir era aquele homem que chamamos “do bem”. Trabalhador, alegre,
sempre disposto a ajudar, um marido e pai maravilhoso, um tio daqueles que a
gente sempre gostava de ter por perto, com um coração maior do que ele. Muitas
vezes, quando escutava alguém descrever dessa maneira uma pessoa que havia
morrido, costumava pensar intimamente que “morreu, virou santo”. Quando meu tio
morreu eu vi que existem pessoas assim, que deixam por onde passam uma imagem
de bem, e cujos defeitos são completamente esquecidos perante as qualidades que
se destacam em qualquer situação.
Tinha visto meu tio cerca de 15 dias antes de sua morte, em um
churrasco na casa do meu irmão mais velho. Ficamos conversando bastante tempo,
tomando uma cerveja gelada, falando bobagem, dando risada, aproveitando o tempo
gostoso de um domingo cujos detalhes ainda estão em minha memória. Depois
disso, só tive notícias dele ao atender ao telefone e ficar sabendo da sua
morte. Era um sábado chuvoso, um dia muito triste, que só dava vontade de ficar
na cama. Após aquele telefonema, a sensação de perda era inexplicável. Como
aceitar que uma pessoa tão cheia de vida, com tanta disposição, que alegrava
todas as reuniões familiares, não estaria mais presente em nenhum de nossos
encontros?
Como meu tio viajava bastante, nos primeiros meses a impressão que eu
tinha era que ele estava fora, mas que na próxima festa ou churrasco iria
encontrá-lo, e que ele iria me oferecer uma cervejinha gelada, ou fazer uma
caipirinha para as mulheres da família. Mas aí houve o primeiro encontro, o
segundo, o terceiro, chegou o Natal e o Ano Novo e então senti que ele
realmente havia partido. Nunca mais aquele sorriso, nunca mais as brincadeiras,
nunca mais o abraço sempre carinhoso com que me recebia em qualquer lugar.
E agora, ao lembrar um ano do dia em que ele se foi, a saudade parece
que é maior ainda do que no começo, talvez por eu saber que nunca verei seu
fim. Lembro que no velório eu pensei que só queria lembrar as coisas boas dele
– quando me toquei de que não havia coisas ruins a serem rememoradas. Se existe
consolo para essa perda, é sabe que meu tio foi uma pessoa que fez a diferença,
e que somente deixou coisas boas a toda minha família.