domingo, 19 de maio de 2013

Escolha difícil e salvadora



O assunto da semana em quase todos os órgãos de comunicação foi a mastectomia dupla a qual a atriz Angelina Jolie se submeteu há três meses, após descobrir, através de um exame genético, que tinha 87% de chances de desenvolver um câncer de mama. Com a cirurgia, ela não eliminou totalmente as possibilidades de vir a ter a doença, mas reduziu o risco para apenas 5%. Em todas as mídias, vi matérias e artigos sobre o assunto, a grande maioria com base científica e explicando corretamente o procedimento, enquanto alguns buscaram apenas o sensacionalismo barato para desmerecer a atitude dela em revelar o procedimento.
Como mulher e ex-paciente do câncer de mama por duas vezes, acho que tenho um bom conhecimento sobre o assunto. Tirar um seio, estando doente, foi uma das decisões mais difíceis que tive de tomar em minha vida. Ou melhor, nem foi decisão, porque os médicos já haviam dito que essa era minha única opção em ficar curada. Mas eu tinha o direito de não fazer a mastectomia e continuar o tratamento com radioterapia e quimioterapia. Claro que quis garantir o máximo possível minha cura, e não hesitei em fazer a cirurgia. Foi triste? Muito, e só quem passa por isso entende o sofrimento e as consequências de uma cirurgia desse porte, que não se limitam ao aspecto físico.
Em muitos dos textos que li e comentários sobre a decisão de Angelina, a tônica era a mesma: um sentimento de despeito e até mesmo uma total falta de respeito com a atriz, apenas por ela ser rica, famosa e bonita. Frases como “ela tem dinheiro, coloca os seios que quiser depois”, “sendo rica do jeito que é, grande coisa, se fosse uma pobretona do SUS (Sistema Único de Saúde) aí sim eu ia respeitar a atitude”, “tirou para poder colocar silicone” (essa foi a mais ignorante de todas!), mostram claramente que, por ser quem é, Angelina é uma pessoa que não pode ter problemas e, se os têm, não pode sofrer por ter dinheiro.
A decisão da atriz em tornar público seu procedimento – que inclusive já é feito no Brasil – mostra para mim que, como qualquer mortal, Angelina tem seus problemas, seus sofrimentos, suas decisões difíceis. O fato de ter dinheiro não a torna imune às dificuldades da vida. A atriz viu sua mãe morrer aos 56 anos por causa de um câncer. Por que então não se prevenir disso? Com certeza, evitar 100% ela não pode, ou melhor, ninguém pode. Mas não nos prevenimos todos os dias contra mil coisas, mesmo sabendo que outras podem acontecer? Ou vamos de encontro ao risco, ou invés de evitá-lo quando conhecemos as chances de algo ruim acontecer? Angelina evitou seu risco. Se vai ficar doente, somente o futuro dirá. Mas ela, em um primeiro momento, fez a sua parte. Se fosse eu, com certeza, teria feito a mesma coisa.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Mostrando as garras



Finalmente, menos de dois meses após ter assumido a tão desejada Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, o deputado federal e pastor Marcos Feliciano (PSC-SP), aproveitou a véspera do feriado de 1º de maio para mostrar suas afiadas garras e incluir na próxima reunião do colegiado, nesta quarta-feira, a discussão sobre o projeto de lei polêmico que permite a psicólogos tratarem a homossexualidade como uma doença, a chamada “cura gay”.
Apesar de já ter declarado vários vezes não ser homofóbico, a inclusão do citado projeto mostra claramente a que veio o pastor: impor seus dogmas religiosos a um Estado que, pelo menos em nossa Constituição, é laico. Para muitas religiões – inclusive o catolicismo – a homossexualidade é vista como um pecado, passível das punições de Deus. Já ouvi muitas pessoas dizerem que “amam o homossexual, mas não suas ações”. Ou seja, ser gay não é a raiz do problema. O não aceitável, como sempre, é a prática do sexo entre dois homens ou duas mulheres.
Não vou entrar aqui no mérito se isso é pecado ou não. Se for, cada um tem a sua consciência e se acerta com Deus depois, quando morrer, ou antes, se houver o Juízo Final. Porém, independente de ser um evento ofensivo em termos religiosos, ser homossexual no Brasil não é crime. Sendo assim, a orientação sexual das pessoas não deve dizer respeito ao Estado, a não ser nos casos em que elas precisem de proteção.
E aí entram os outros dois projetos que serão discutidos: a criminalização da discriminação contra homossexuais e heterossexuais. Sou heterossexual “assumida” e, nos meus 41 anos de vida, nunca me senti discriminada por isso. Já me senti sim discriminada por ser acima do peso, por não ter casado, por ter optado em não ser mãe, até mesmo por ter tido câncer de mama. Mas nunca me senti discriminada por ser heterossexual. Muito pelo contrário, minha “orientação sexual” nunca foi motivo de piadas ou questionamentos. Concluindo, não acredito que haja necessidade de um projeto que “criminalize” essa suposta discriminação, uma vez que ela não existe.
Mas já vi muitos amigos homossexuais serem discriminados em ambientes de trabalho, de lazer, até mesmo dentro da própria família. Já vi olhares de soslaio, piadas ofensivas, quando não a própria agressão física, pura e simplesmente porque algum imbecil havia acreditado, em sua “macheza”, que “homem tem de ser homem, e parar com sem-vergonhice”. Apenas para se ter uma ideia: em 2012, 338 homossexuais foram mortos no Brasil, contra 266 em 2011, registrando um aumento de 21% de casos no período, ou uma morte a cada 26 horas. Sendo assim, só não vê quem não quer – ou é homofóbico – que o projeto de criminalização da homofobia está mais do que na hora de ser aprovado e colocado em prática no Brasil.