quarta-feira, 30 de setembro de 2009

O direito de não ser mãe

Admiro as mulheres que sonham em ter filhos. Admiro e respeito esse sonho, muitas vezes realizado uma, duas ou mais vezes, com o nascimento de crianças perfeitas e muito amadas pelo tanto que foram desejadas. Mas, ainda assim, apesar do fato de adorar crianças (e de ser adorada por elas), nunca quis ser mãe. Esse desejo, alimentado por milhões de mulheres em todo o mundo, nunca fez parte dos meus objetivos de vida.
E estou falando de algo que não surgiu agora, mas sempre esteve enraizado na minha pessoa. Quem me conhece bem nunca me ouviu dizer “quando eu tiver um filho...” ou algo do gênero. E o fato de não ter filhos, em minha visão, não me torna mais ou menos feliz do que sou. Apenas sou feliz com minha decisão, sem peso na consciência nem arrependimento por não ter seguido aquilo que, segundo a sociedade, é o destino natural da mulher: ser mãe.
Mas vejo que minha decisão incomoda. Sou muito cobrada por isso. Não por meus pais, que nunca exigiram de mim o padrão “casamento e filhos”, tão comum a todo mundo. Parentes, amigos, colegas de trabalho, enfim, muita gente que me cerca sempre tem essa pergunta na ponta da língua: “Mas você realmente não quer ter filhos?”
Antes eu me sentia meio que alienígena mas, como nunca fui de me deixar pela opinião dos outros, não me martirizava por isso. E a cobrança vem de diversas maneiras. Uma das melhores frases que ouvi sobre o assunto foi a seguinte: “Mas você tem de experimentar a sensação de ser mãe para poder dizer que não gosta”. Certo! Então eu engravido, tenho um filho e, depois de um mês, vejo que realmente a maternidade não é para mim. O que eu faço? Devolvo a criança para quem? Sim, porque filho não é como cachorro que a gente comprar e, se depois se arrepende, passa para alguém que adora animais. Filho é para sempre. E como ficar para sempre com algo que nunca se desejou?
Outra frase ótima é a seguinte: “Mas quem vai cuidar de você quando estiver velha?” Supondo que eu tenho um filho e ele resolve morar na Austrália. “Não, você não pode fazer sua vida longe daqui, por que quem vai cuidar de mim quando eu ficar velha?” Ou seja, vou direcionar a vida do meu filho de acordo com o que eu quero que seja feito, podando assim seus sonhos. E tudo porque, já que dei a ele o dom da vida, fica então a obrigação de cuidar de mim quando eu estiver velha. Não acho que a gente tem filho para garantir um enfermeiro no fim da vida.
Quem nunca viu por aí mães que, se bem observadas, jamais deveriam ter engravidado? Que não cuidam direito das crianças, não têm a mínima paciência, não educam, não possuem aquilo que se chama de “instinto materno”. Eu mesma conheço uma que, mãe de um moleque de três anos, quando chega em festas senta para conversar e não levanta uma vez para olhar se o filho está bem. Nem eu conseguia fazer isso quando estava com minhas sobrinhas pequenas! Onde está o tal instinto dessa mulher?
Hoje as mulheres são cobradas e, quando não correspondem àquilo que se espera delas – maternidade, sucesso na carreira, um relacionamento estável – sentem-se culpadas ou então acham que algo está errado. Ninguém é obrigado a ter filhos se não quer. Eu não chego para minhas amigas dizendo que elas não devem engravidar, e hoje não admito mais ninguém me cobrando que tenho um bebê. Afinal, tenho muitos direitos sobre a minha pessoa. E um deles é o direito de não ser mãe.

domingo, 20 de setembro de 2009

O medo de viver

Morro de medo de barata. Medo não, tenho verdadeiro pavor, um sentimento tão forte que, quando vejo uma, sou incapaz de me mexer. Se ela estiver no meu caminho, deixo de ir até onde pretendia, e procuro me esconder até que alguém a mate. Parece exagero, mas não é. Um dia, conversando com um amigo, ele ficou impressionado com a minha visão das baratas:
- Odeio quando a barata some, sabe?
- Por que?
- Porque quando ela se esconde eu não tenho como me defender.
- Defender do que????? Estamos falando de uma barata, não de um crocodilo!
- Ah... para mim, a barata é um ser mutante!
- Meu Deus, por que isso?
- Ela tem o dom de me paralisar!
Vejo que a maioria das pessoas acha exagero o medo que sentimos de certas coisas. Mas isso é instintivo do ser humano. Eu mesma já me peguei rindo dos medos de outras pessoas. E hoje tento não fazer mais isso. Porque os medos surgem sem que saibamos como, e muitas vezes nos dominam de uma maneira que nos impede de fazer muita coisa.
E aqui não estou falando de medo de barata. Estou falando do medo de viver. Vejo muita gente que existe, mas não vive. Não ama, não sai do emprego que detesta, não tenta fazer aquele curso com que sonha há anos, não assume sua homossexualidade, não termina um casamento estagnado.
Vejo esses medos como a barata que me impede de sair de casa porque está para a minha porta. Qual o poder que ela tem de me paralisar? É um inseto, pequeno, que com apenas uma pisada eu esmago. Ainda assim, muitas e muitas vezes voltei para trás porque ela estava ali, me desafiando. E parece que, quando mais medo a gente tem de uma coisa, mais ela nos persegue.
E o que nos impede de realmente viver? Não vou mais me apaixonar porque posso me machucar, ouço muita mulher falar. Não vai se apaixonar e deixar de sentir aquele frio no estômago quando o celular recebe uma mensagem da pessoa adorada? Deixar de acordar com um beijo na nuca, ou um bilhete no travesseiro dizendo o quanto é amada?
Não vai atrás de outro emprego porque “todos os lugares são iguais”. Será mesmo? Se todo lugar é igual, por que então não tentar e fazer a diferença? Porque não buscar algo além do trabalho monótono e realmente usar sua inteligência e criatividade para uma tarefa prazerosa?
Não termina o casamento porque “e se eu ficar sozinho depois”? Assim, mais fácil ficar num relacionamento fracassado, infeliz (e fazendo a outra pessoa também infeliz), do que tentar encontrar um novo amor ou simplesmente ficar sozinho, mas em paz consigo mesmo. Será que vale a pena dividir a cama com alguém que não faz mais o nosso coração disparar?
Espero que as “baratas” que impedem a todos de realmente viver sejam esmagadas. Eu ainda terei de lidar com elas, mas pelo menos o medo de viver eu já perdi. E isso foi a melhor coisa que me aconteceu na vida. Quanto a esse inseto asqueroso... um dia eu consigo dar a chinelada certeira e tirá-la da minha porta.