domingo, 27 de maio de 2012

Diversos times, a mesma diversão

Trabalho em uma redação com cerca de 40 pessoas que se dividem, em sua grande maioria, entre corintianos (me incluo nesse grupo), palmeirenses, são paulinos e santistas. Tem também bugrino e unionista, e frequentemente o assunto futebol toma conta das bancadas onde predominam os colegas do sexo masculino. Marcadamente, as conversas se intensificam na segunda-feira e na quinta-feira, dias posteriores às rodadas dos campeonatos. Digo sem vergonha nenhuma que não entendo nada de futebol e sou daquelas torcedoras tão à toa que nem sei todos os nomes dos jogadores do meu time. Aliás, parei de assistir aos jogos do Corinthians, principalmente aqueles decisivos, já há alguns anos, porque acaba ficando muito nervosa e um dia percebi que, enquanto eu me acabava gritando, e até mesmo chorando por uma derrota, os jogadores nem sabiam que eu existia e muito menos que me importava assim com o time. Independente disso, respeito quem fique vidrado na televisão os 90 minutos de jogo, sofra a cada lance perdido e comemore cada gol conquistado.
Mesmo sem entender nada, volta e meia entro nas conversas dos colegas, principalmente para fazer brincadeiras. E me admiro sempre em ver que, num ambiente onde cerca de 40 pessoas convivem diariamente, e os times do coração são os mais diversos, não existe bate boca nem discussão agressiva por conta de futebol. Existem sim as piadas, a “tiração” de sarro quando o time do adversário perde, os comentários dos lances pelos entendidos e, assim como em todo país, as escalações e escolhas que poderiam ter sido feitas – afinal, existe um técnico dentro de cada torcedor. Por isso ainda me admiro sempre quando vejo brigas de torcedores, discussões acaloradas e ofensas por causa do futebol. Se esse esporte é realmente “a alegria do povo”, ele deve mesmo servir a isso, e não a atos de violência que volta e meia vemos nos noticiários, inclusive com mortes estúpidas e desnecessárias. Sei que o quadro está mudando, e fico feliz quando vejo mulheres e crianças nos estádios, sorrindo, gritando, mostrando a camisa, chorando de emoção e torcendo saudavelmente pelo seu time. Famílias inteiras hoje assistem aos jogos, e ir ao campo deixou de ser um hábito predominantemente masculino. Tenho amigas que inclusive não perdem um jogo do XV de Piracicaba, e até hoje não me lembro de elas terem relatado brigas entre torcidas. É esse espírito de coleguismo que admiro aqui na redação. Tem aqueles meio fanáticos sim, mas até hoje não vi ninguém perdendo a calma por causa de futebol. Agora os corintianos da redação sabem que todo mundo está torcendo para o Santos. Mesmo assim, estamos todos juntos. E eu, particularmente, rezando para que o meu time saia vencedor.

domingo, 13 de maio de 2012

Amor além da minha compreensão

Uma vez escrevi aqui sobre o direito de não ser mãe. Para quem não sabe, eu nunca quis ter filhos, a despeito do fato de adorar crianças. Algumas vezes até cheguei a me considerar egoísta por essa decisão, mas ainda assim arquei com suas consequências. Por um desses acasos do destino, uma decisão que antes era apenas a minha vontade hoje é compulsória, porque por problemas de saúde não posso mais engravidar. Esse é um problema que nunca me incomodou, visto que minha decisão de não ser mãe deve ter sido tomada desde que tenho consciência sobre o assunto. Uma das consequências dessa decisão é não saber o que significa o “amor incondicional de mãe”. Sei muito bem o que é o amor de tia e madrinha. Amo minhas sobrinhas Juliana e Isabela como se fossem minhas filhas, mas tenho consciência de que minhas responsabilidades e preocupações com elas estão a anos-luz de distância da que seus pais têm. E sempre me surpreendo em ver como o amor materno é algo que transcende todos os sentimentos que imagino já ter sentido em minha vida. Posso não saber o que é o amor de mãe, mas sei muito bem o que é o amor de filha. Não sou a melhor filha do mundo, acho até que peço em muitas coisas em relação a minha mãe, poderia ser mais paciente e mais compreensiva com algumas de suas atitudes, mas talvez seja o fato de saber que ela me aceita como sou que me permite ser assim. Minha mãe é aquilo que costumamos chamar de “pessoa do bem”. Ajuda quem pode, cuida de quem precisa, é amiga de todo mundo. Algumas vezes até acho que as pessoas se aproveitam desse jeito dela, mas tenho de aceitar que ela seja assim e se doe a quem quiser. Fazemos hidroginástica juntas e, quando vou sozinha, todas as nossas colegas vêm me perguntar o que houve e, se algo está errado, várias telefonam em minha casa para saber como ela está. Seu jeito alegre e conversador (sim, eu tenho a quem puxar!) acaba fazendo dela uma pessoa fácil de fazer amizade e se dar bem. Talvez eu tenha entendido em parte o que significa amor de mãe quando fiquei doente, em 2008. Além de cuidar de mim durantes as cirurgias, minha mãe me acompanhava às sessões de quimioterapia e, sabendo do meu verdadeiro pavor por agulhas, ficava ali segurando minha mão para eu me acalmar. Não que eu ficasse calma, mas era reconfortante saber que ela estava ali o tempo todo. Somente uma mãe fica assim ao lado da cria – sofrendo junto, mesmo que seja sem derramar lágrimas. Eu nunca vou saber o que é ter esse amor à prova de tudo. Mas com certeza sei que eu tenho uma mãe maravilhosa, mas aproveito para desejar à ela e a todas as mães um dia muito feliz, de todo o coração.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Discriminação às avessas

O sistema de cotas raciais, tema que sempre gera polêmica em discussões, foi na última semana estabelecido como constitucional em votação unânime do STF (Supremo Tribunal Federal). Para os defensores do sistema, uma vitória dos afrodescendentes, que notoriamente são os menos favorecidos economicamente no país e, por consequência, acabam tendo menos chances de entrar em uma universidade pública. Para aqueles que, como eu, acreditam que o sistema deveria ser social, a vitória é da discriminação às avessas: se preciso dar cotas levando-se em consideração apenas a cor da pele da pessoa, estou desmerecendo essa raça, considerando-a menos capaz de conseguir seu espaço do que aqueles diferentes da sua etnia. Acredito que muita gente vá entender meu comentário como racista, mas conheço muitos afrodescendentes que pensam como eu. Gente que teve de se esforçar muito para conseguir uma vaga numa faculdade, que teve depois de se esforçar mais ainda para pagar o curso, que trabalhava e estudava e tinha poucas horas para se dedicar aos livros, cujos finais de semana eram sempre sacrificados para que pudesse colocar em dia os conteúdos das aulas. Gente que hoje afirma com orgulho que não precisou de cota nenhuma para entrar na universidade, e que até contou com bolsa para se formar – bolsa essa conquistada por mérito, e não por cor da pele. Vivemos num país onde as diferenças sociais ainda são muito grandes e o preconceito, ainda que velado, existe, principalmente em áreas onde a predominância é da população descendente de europeus. Ainda assim, penso que decisões como a do STF servem muito para acirrar esse racismo. Afinal, há muitos brancos que também são pobres, que passam dificuldades, que não têm um ensino fundamental de qualidade. Por que eles não podem disputar as cotas em condições de igualdade? Por que o critério ser racial e não social? Tive a chance de fazer uma universidade pública. Em minha classe havia quatro afrodescendentes, e nenhum deles havia se beneficiado do sistema de cotas. Todos eles provinham de famílias cuja situação econômica era difícil, e trabalhavam para conseguir estudar. Não tenho o contato de todos, mas um deles sei que tem um ótimo cargo, está financeiramente muito bem, e reconhecido como um grande jornalista no Paraná. Repito: sem cota nenhuma. Àqueles que vão dizer “ah, mas isso é um”, vale lembrar que o ministro Joaquim Barbosa, do STF, também veio de família muito humilde, e chegou sozinho ao seu posto. Oprah Winfrey, hoje a apresentadora de TV mais famosa do planeta, era paupérrima, foi estuprada, sofreu todo tipo de humilhação que podemos imaginar, por ser negra e mulher. Não se beneficiou de cotas, e hoje é exemplo de luta para muita gente. Citei dois famosos, mas existem milhares de anônimos que não usaram sua cor de pele para conseguir seu espaço na sociedade. Podem ter conseguido ajuda por sua condição social, e com certeza fizeram por merecer o apoio. Está na hora de acabarmos no Brasil com o quesito “coitadismo” na hora de beneficiar as pessoas, e lembrarmos que existe algo muito importante quando pensamos em crescimento profissional e pessoal: o mérito, um verdadeiro formador de cidadãos.