quinta-feira, 27 de maio de 2010

Saudades do café na mesa

Esta semana senti saudades de mim. Saudades do que fui, do que me ajudou a ser quem sou, de pessoas que me acompanharam sempre, e de tudo aquilo que me formou. Não vejo a saudade com um sentimento dolorido – muito pelo contrário, se sinto saudades de algo ou alguém é porque aquele momento vivido foi importante para mim.
Senti saudades de ficar de castigo (ou até mesmo tomar umas chineladas) quando aprontava alguma coisa mais séria. Mas o que mais senti saudades foi da minha mãe fazendo um café da tarde maravilhoso que eu e meus amigos adolescentes aproveitávamos ao máximo. Nesses dias, ela colocava toda a porcelana na mesa e nos servia deliciosas guloseimas acompanhadas de um café fresquinho. Todos os meus amigos e do meu irmão adoravam ir a minha casa tomar esse café – o lugar onde eles eram tratados como adultos, e conversavam com minha mãe de igual para igual.
Depois, na faculdade, o café na casa dos amigos (quando estava frio demais para a cerveja!) virou um hábito. Aliás, a bebida foi minha companheira em muitas noites que, atolada de trabalhos a entregar, eu passava em claro datilografando sozinha. Chegava à faculdade e já pegava um copo cheio com a “ tia” do lanche. Eu e meu melhor amigo, Ursão, passávamos horas filosofando em volta de uma garrafa térmica que, à medida que se esvaziava, era cheia de novo por mim.
O café continua fazendo parte da minha vida. Ainda hoje temos o hábito de tomar café da tarde em casa. Basta chegar uma visita e, dependendo do dia, meu pai sai para comprar pão fresquinho, queijo, leite, e outras delícias. Enquanto isso, minha mãe esquenta o leite e passa um café forte, sem açúcar, marca registrada dela no cuidado com meu pai, que é diabético. E a reunião em volta da mesa, para comer e conversar, acaba se prolongando por horas.
Engraçado como esses hábitos se fixam em nossa vida. Meu irmão mais velho volta e meia passa em casa à noite apenas para tomar uma xicarazinha, feita por minha mãe. E tem de ser o da minha mãe, que o meu não serve! Segundo meu pai, “é muito fraco, e não tem gosto”.
Essas reuniões em volta da mesa me ajudaram a ser quem sou. Discussões sobre assuntos banais ou problemas familiares fizeram (e ainda fazem) parte desses momentos em que, entre uma mordida e outra, expressamos nossas opiniões.
Quando estive doente esse era um dos melhores momentos do meu dia. Sentar com quem vinha me visitar, rir, escutar um pouco das histórias que estavam acontecendo no mundo lá fora (afinal, era somente eu quem estava na cama!), me traziam uma sensação de normalidade que estava fora da minha rotina.
Esses tempos saudosos não voltam mais, mas a lembrança deles está intacta em minha memória. Basta o cheiro fresco do café, para reavivá-la!

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Pequenos podres poderes

Não sei de quem ou onde ouvi a seguinte frase: “Dê o poder a uma pessoa e você vai conhecê-la realmente”. Essa máxima pode ser aplicada perfeitamente a muitos funcionários públicos. Basta ter o poder na mão, e se acham no direito de decidir quando e como atenderem um cidadão. Se não estão a fim de atender, azar de quem está esperando. Não estou falando que todo funcionário público é assim, mas uma boa parte, amparada pela famosa estabilidade, se acha no direito de mandar e desmandar na hora de atender a população.
Engraçado que esse tipo de comportamento geralmente é visto em quem ocupa cargos sem destaque algum, mas que lida diretamente com o público. Afinal, o trabalho talvez seja o único lugar onde essas pessoas têm algum poder. Existe até um nome para esse fenômeno: Síndrome da Pequena Autoridade.
Poderia citar aqui dezenas de vezes em que me deparei com esse tipo de atitude. Quando uma amiga foi tirar a segunda via da identidade, há cerca de dez anos, não havia todas as facilidades online. A funcionária da Delegacia a atendeu com a maior má vontade, sem querer dar nenhuma informação e ainda achando que ela deveria ir a um despachante para pedir outro documento.
Em postos de saúde, então, a grosseria parece ser a tônica de muitos funcionários. Há quase um mês fui tomar a vacina contra a gripe Influenza A. Como me encaixo no grupo de risco, levei um atestado comprovando minha necessidade da dose. Menos de cinco minutos após ter entregado o documento, lembrei que precisava da vacina da febre amarela. Quando informei isso à atendente, a mulher reclamou que “agora ia complicar”. Questionei o que tanto iria complicar, e ela, com a maior cara de pau, disse que teria de ir novamente à sala das aplicações para levar meu pedido. Detalhe: a sala ficava a menos de dez metros de onde estávamos. Como sou muito consciente dos meus direitos, falei que, mesmo complicando, ela ia levantar e avisar a enfermeira, porque eu não iria voltar outro dia para tomar novamente vacina. Ela resmungou, mas foi avisar a enfermeira.
Como repórter, recebo sempre reclamações de mau atendimento em repartições públicas, seja no posto de saúde, na regional do bairro, na Prefeitura, no banco. Parece que algumas pessoas têm um prazer secreto em dificultar a vida do cidadão, principalmente dos mais humildes, esquecendo que ele é um contribuinte. Pior: agem assim porque sabem que dificilmente uma reclamação é levada adiante e, mesmo que o seja, mais dificilmente ainda vai resultar em qualquer tipo de punição. É a Síndrome ocupando o espaço que deveria ser preenchido por boa vontade e educação. Por isso, quando se sentirem mal atendidos ou prejudicados, façam valer seus direitos. O funcionário não está ali lhe fazendo um favor: é obrigação dele atender bem ao cidadão.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Crueldade sem fim e impune

O Brasil acompanhou revoltado, na última semana, o sumiço e apresentação à Justiça do Rio Janeiro da procuradora aposentada Vera Lúcia de Sant'Anna Gomes, acusada de torturar uma menina de dois anos que estava sob sua guarda para adoção. As fotos da menina, com os olhos inchados e quase fechados de tanta agressão, foram mostradas em toda mídia, e somente pessoas sem coração não se indignaram com o sofrimento da criança que, durante um mês, foi agredida por quem deveria protegê-la.
Notícias como essa estão se tornando cada vez mais comuns em todas as classes sociais e lugares do País. Pais que espancam cruelmente os filhos, mães que deixam crianças trancadas em casa para irem a bailes, parentes e vizinhos que abusam sexualmente dos pequenos aumentam a cada dia. Uma crueldade sem fim que é agravada por um fato já corriqueiro em nosso sistema judiciário: a impunidade reinante.
No caso dessa criança em específico, o maior espanto foi a divulgação de que a mesma procuradora já havia sido denunciada pelo mesmos tipo de agressão, também em outra criança que estava sob sua guarda. Fica aí a pergunta que não quer calar: como foi permitido que ela conseguisse uma segunda criança para criar, enquanto outros casais realmente amorosos ficam anos na fila de espera e passam por um crivo rigoroso de assistentes sociais e psicólogos antes de serem aprovados para a adoção?
São vários os fatos que chocam, revoltam e mostram como a criança é realmente um ser indefeso no nosso País. O advogado da acusada, Jair Leite Pereira, que já tentou dizer que ela era inocente, agora mudou seu discurso e alega que, de acordo com o IML (Instituto Médico Legal), “as lesões foram leves e não causaram nenhum mal estar maior na criança”. Porém, um laudo complementar do IML aponta lesões graves na garota.
Sabemos que o papel da defesa é proteger seu cliente. Mas daí a alegar que não houve mal estar maior à pequena, que nem conseguia abrir os olhos, é chamar a população de idiota e a Justiça de cega. Quando as acusações contra a procuradora foram apresentadas, há um mês, a menina foi levada para o hospital e precisou ficar três dias internada. Que tipo de lesão leve é essa que obriga uma criança a ser internada durante todo esse tempo?
Pior que a lesão física são as lesões psicológicas que ela sofreu nesse período. Em princípio, a procuradora já foi obrigada a custear um tratamento psicológico para a menina. Melhor que nada, mas como essa pequena criatura vai poder novamente confiar em outra pessoa? E, para finalizar: até quando as agressões contra os pequenos, em nosso País, deixarão de ser tão banalizadas? Outro dia escrevi que tinha orgulho de ser brasileira. Porém, quando vejo essa impunidade, preferia ter nascido em outro país qualquer, onde as leis são respeitadas e cumpridas.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Sucesso da baixaria

Foi divulgado hoje em toda a mídia que o “Big Brother Brasil 10” foi o programa que mais recebeu denúncias de desrespeito aos direitos humanos na campanha "Quem financia a baixaria é contra a cidadania". Das 391 denúncias feitas pelos espectadores, entre agosto de 2009 e abril de 2010, 227 referiam-se ao programa. As reclamações foram classificadas como desrespeito à dignidade da pessoa humana, apelo sexual, exposição de pessoas ao ridículo e nudez.
Fórmula que tem dado certo há cerca de dez anos no Brasil, o reality show, que tem público cativo em nossas emissoras, tem se mostrado, cada vez mais, um desserviço à televisão brasileira. Antes que alguém me critique e queira impor que eu assisto este tipo de programa, afirmo que já fui sim uma fã do formato, mas hoje não perco um segundo do meu tempo vendo quem está com quem debaixo do edredom e muito menos discutindo barracos fabricados em rodas de bar com meus amigos. Respeito quem gosta, mas eu tenho coisas mais interessantes a fazer ou assistir no horário em que eles são transmitidos.
O sucesso desses programas não se restringe ao nosso País, tanto que a fórmula deles veio de fora. A curiosidade em torno das atitudes de várias pessoas fechadas numa casa, sem nada de produtivo para fazer, é comum a europeus, americanos, africanos, asiáticos, enfim, a quase todos os povos.
Não acho que todos os programas desse tipo sejam ruins. Um bom exemplo é o “Extreme Makeover”, aqui no Brasil copiado por Luciano Huck com seu “Lar Doce Lar”. Porém, diferente dos Estados Unidos, onde o programa é um sucesso absoluto, aqui a audiência não subiu espantosamente depois que ele foi implantado dentro do “Caldeirão”. Para quem não conhece, no “Extreme Makeover” uma família tem sua casa reformada ou, se for o caso, reconstruída. A mobilização é gigante para que isso ocorra. São vários profissionais, vizinhos, amigos, e astros que se prontificam a ajudar as pessoas necessitadas. Também ocorrem conflitos, afinal, os organizadores têm uma semana apenas para terminar tudo. Porém, são conflitos superados por um bem comum: dar uma casa nova a uma família.
Ninguém fica de biquíni, não há cenas sugerindo sexo, nem intrigas para um derrubar o outro. Não há barracos “reais”, comentários racistas e preconceituosos, ameaças verbais, “filosofias” sem o menor sentido e as “estratégias” para se conquistar o prêmio. Em minha opinião, o tal milhão dado nesses realities seria muito melhor usado para reformar ou reconstruir uma ou várias casas. Uma pena, mas talvez a maioria dos telespectadores ainda não esteja preparada para trocar as baixarias por ajudar os mais necessitados.