Essa semana
a 8ª Câmara de Direito Privado de São Paulo condenou o jornalista Boris Casoy e
a TV Bandeirantes a pagarem uma indenização de R$ 21 mil por danos morais ao
gari Francisco Gabriel de Lima. Para quem não se lembra, na noite de 31 de
dezembro de 2009, após Francisco Lima aparecer em uma vinheta desejando boas
festas, uma falha técnica levou ao ar o áudio de Boris dizendo: “Que merda:
dois lixeiros desejando felicidades do alto das suas vassouras. O mais baixo na
escala do trabalho”.
A notícia
não estava em destaque no site onde a li, mas ainda assim, em menos de quatro
horas, mais de 300 comentários já haviam sido postados, a grande maioria
criticando a atitude do jornalista, e até mesmo dizendo que o valor da
indenização havia sido pouco, comparado aos lucros que a TV Bandeirantes tem e
ao salário de Boris Casoy.
O comentário
do profissional realmente foi lamentável ou, como ele mesmo diz, “uma
vergonha”. Mas também lamento ter de dizer que é o tipo de comentário bastante
comum no Brasil, onde as pessoas mais simples são constantemente desmerecidas
apenas porque estão em degraus mais baixos das chamadas “pirâmides sociais”.
Indo mais
longe, às vezes chego a acreditar que o preconceito no Brasil é muito mais
social do que racial. Um bom exemplo é a maneira que hoje todo o país admira o
presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa. Aliás, o que as
pessoas mais admiram é a ascensão social dele, que veio de uma família humilde
e hoje conquistou o mais alto posto jurídico do país. Barbosa, todos sabem, é
negro. E nos comentários ninguém fala da sua origem étnica, a não ser para
lembrar que ele não se valeu de cotas raciais para conquistar seu espaço.
Pelé também
é orgulho nacional por seu desempenho no futebol. E as pessoas também não falam
dele por sua cor, mas sim por seu profissionalismo, por ele ainda ser um
símbolo do país no exterior, mesmo estando fora dos gramados há mais de 30
anos. Em ambos os casos, estamos falando de pessoas que, a despeito de sua
origem racial, hoje estão no topo de pirâmide social – e por isso são
respeitadas.
Porém, o
preconceito que os brasileiros têm com os chamados “pobres” é notório. Se
entramos em uma loja chique vestidos de maneira mais simples, somos sempre mal
atendidos. Isso quando somos atendidos! Há muitos anos passei por uma situação
assim em Piracicaba, havia saído do trabalho e entrei numa loja de grife para
ver uma calça jeans. A vendedora – que com certeza comprava as roupas a preço
de custo e parcelava em dez vezes – me atendeu como se eu não tivesse condições
de comprar nada da loja. Isso porque, na concepção dela, o fato de eu não estar
trajada com marcas famosas fazia de mim alguém sem poder aquisitivo.
Também já
escutei gente falando que os aeroportos deviam ter uma ala só para “aquele povo
pobre” que agora consegue viajar de avião. Oras, se eu quero ter uma ala
exclusiva, então devo pagar primeira classe, e não querer impedir que os outros
tenham o mesmo tratamento que eu.
A punição a
Boris Casoy foi mais do que justa. Mas as nossas reações de indignação, tão
veementemente discursadas, muitas vezes escondem nosso próprio preconceito
contra aqueles que não possuem o que possuímos. Boris Casoy estava na televisão
falando para milhões de pessoas. Mas será mesmo que, dentro de nossos lares ou
entre amigos, não fazemos os mesmos tipos de comentários?