domingo, 15 de julho de 2012

Enaltecimento do óbvio


Essa semana todas as mídias foram tomadas pela história de um casal de moradores de rua que achou R$ 20 mil e devolveu o dinheiro ao seu verdadeiro dono, o proprietário de um restaurante. Com um desfecho digno de filme hollywoodiano, em que o bem sempre vence o mal, o casal chegou a ser ameaçado de morte por quem havia roubado o dinheiro, mas acabou sendo protegido e recompensado com emprego e um lugar para morar pelo proprietário do restaurante.

Analisando bem todo esse cenário, cheguei mais uma vez àquela velha (e triste) conclusão: moro em um país onde a pessoa ser honesta e devolver dinheiro que não pertence a ela é motivo de notícia em todas as mídias. Pior: por eles serem moradores de rua, ou seja, pobres, parece que a atitude tem um valor maior ainda, como se pobreza fosse justificativa para desonestidade.

Por falta de heróis e por vivermos em uma sociedade onde o ter é essencial, e ser não vale grande coisa, esse tipo de comportamento toma proporções inimagináveis em países desenvolvidos como Suécia, Inglaterra, Alemanha, entre outros. Não que nesses lugares não exista gente desonesta – a diferença é que para essas sociedades ser honesto é o padrão, e não a exceção.

Claro que achei louvável a atitude do casal, que precisava muito do dinheiro e ainda assim preferiu continuar na pobreza a perder a honra, como disse o homem quando perguntado sobre o porquê havia tomado aquela decisão.

Também foi louvável a atitude do proprietário, que poderia simplesmente ter dito “muito obrigado”, dado uma gorjeta e encerrado o assunto. Não que ele teria errado se fizesse isso. Não acho que ele fez “sua obrigação”, porque não penso que pelo fato de a pessoa ter dinheiro ela seja obrigada a fazer caridade. Do mesmo jeito que as pessoas enxergam a devolução do dinheiro como algo fora do comum (repito, ser honesto não é qualidade, é obrigação), deveriam enxergar a oferta de emprego e casa como algo a ser admirado, principalmente em um país onde raramente vemos gestos de generosidade desse tipo serem veiculados pela mídia. A não ser, claro, que o gesto de generosidade seja feito por alguma “piriguete” ou alguma “celebridade” em busca de mais espaço na mídia, o que é conseguido sem muita dificuldade.

Para mim, dessa história toda fica apenas uma conclusão: ainda estamos muito longe de sermos um país desenvolvido, já que a honestidade é uma característica tão rara que vira notícia apenas por ter sido praticada. Até por isso é comum nas propagandas eleitorais os candidatos usarem o termo como se fosse um diferencial entre os concorrentes. Ser honesto virou sinônimo de virtude, de qualidade, de diferencial, quando deveria ser simplesmente a obrigação de qualquer pessoa de bem.

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