domingo, 13 de abril de 2014

Admirar não é estuprar


A estatística divulgada pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) no último dia 4 de que 26% dos homens concordam, total ou parcialmente, com a afirmação de que "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas", corrigiu uma pesquisa anunciada uma semana antes, quando essa porcentagem era de 65%. Para muitos, o novo número trouxe uma sensação de alívio. Na verdade, a estatística ainda é muito alta.
Se pararmos para pensar, isso significa que um em cada quatro homens no Brasil acredita que a roupa usada pela mulher é a causa do estupro. Esse universo pode englobar nossos familiares, amigos, colegas de trabalho, conhecidos. Por essa absurda lógica machista, a mulher que usa um vestido curto deve ser violentada sexualmente. Comentários como “se ela estava assim é porque queria chamar a atenção” são comuns quando um caso de estupro é divulgado. À roupa que a mulher estava usando, muitas vezes, é dada mais atenção ao local onde ela se encontrava, ou o horário em que o ato ocorreu. Afinal, a culpa pelo ato, pelo machismo vigente no Brasil, é da vítima. O homem, como sempre, “foi instigado” a cometer o crime.
Que a roupa seja usada para chamar a atenção é óbvio. Se não fosse assim, homens e mulheres iriam de pijama a eventos sociais, sem se importar com os olhares dos outros. Mas faz parte de todas as sociedades a vestimenta como forma de chamar a atenção do sexo oposto. Porém, existe uma diferença imensurável entre ser olhada e ser estuprada.
Ao usar um vestido curto ou blusa decotada uma mulher pode sim querer a atenção masculina. Ela pode desejar ser admirada, paquerada, cortejada, elogiada. Isso, porém, não significa que ela deseje sem tocada, acariciada em suas partes íntimas, “encoxada” ou estuprada. A mulher também tem o direito de escolher com quem quer um envolvimento físico. Ela não é obrigada a aceitar passivamente o ato sexual porque seu vestido chamou a atenção de alguém que não a atraiu fisicamente. Não será sempre não, em qualquer idioma.
Os defensores desse pensamento machista parecem se esquecer que o estupro é um ato, acima de tudo, de poder. O estuprador sente prazer em subjugar sua vítima, e não em conquistá-la. Se a roupa fosse a razão para o estupro, bebês, crianças e idosos jamais sofreriam tal tipo de violência.
Estupro também é um crime de oportunidade. Se não fosse assim, estupradores atacariam suas vítimas de biquínis em praias lotadas, e não as esperariam em locais isolados para as subjugarem.
Para quem comemorou a correção da estatística, vale lembrar que 26% ainda é um número alto. Nesse universo, até mesmo um amigo pode ser esse um entre quatro que acha que você merece ser estuprada por usar roupa curta. E pode, baseado nesse pensamento, cometer o estupro. Pense nisso.


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